No Brasil, já é possível encontrar clínicas especializadas em tratamentos com substâncias psicodélicas. Em reportagem de capa da Veja São Paulo, o jornalista Pedro Carvalho explicou como esses tratamentos são desenvolvidos e detalhou o trabalho de lugares como a Beneva — que trata de depressão resistente e dependências químicas com cetamina e ibogaína, respectivamente.
Como lembra a reportagem, uma série de estudos reforçam a efetividade e a segurança das substâncias, quando administradas em ambiente médico. Através da criação de novas ligações no cérebro, o alívio dos transtornos pode ser sentido em poucas horas.
O psiquiatra Dartiu Xavier, consultor científico da Beneva e coordenador do ambulatório de dependência química da Unifesp, pesquisa psicodélicos desde a década de 1990 e lembra que um terço dos pacientes de depressão não respondem a medicamentos comuns. Quando tentam a cetamina, entre 50% e 70% têm uma melhora relevante, ou seja, uma redução de pelo menos 50% dos sintomas. Aproximadamente 30% entram em remissão (a total ausência, ainda que temporária, dos males da doença)”, afirma.
Os efeitos variam de acordo com o contexto e as vivências de cada pessoa. “Durante as sessões, eu coloco fones de ouvido com música clássica. Se fixo a atenção em uma nota musical, ela se transforma em uma cor. Acho a ‘viagem’ muito gostosa”, disse à reportagem Sônia Bonadio, 73, uma bancária que já tinha perdido o ânimo de viver e chegou a pensar em “dar uma sumida do mundo”. “Os antidepressivos que tomava não tinham mais efeito. Com a cetamina, depois de duas aplicações eu me sentia outra pessoa”, explica.
O psiquiatra Rodrigo Delfino, especialista da Beneva, lembra: “É um salto que a psiquiatria não via desde o surgimento dos antidepressivos. E novos usos devem ser aprovados em breve”.
A reportagem explica que as sessões com cetamina duram cerca de 45 minutos e são feitas em ambiente controlado. “A sensação é de que você está em um sonho muito realista. Vejo pessoas e lugares do passado — por isso, no dia seguinte costumo ficar muito pensativa”, contou Giovana Martins, 29, que, há um ano, sofria de depressão refratária e crises de pânico.
A ibogaína, uma raíz de origem africana, é mais usada no tratamento de pessoas com dependência química. “Participei do único estudo feito no país, que acompanhou 75 dependentes de crack, cocaína, heroína e outras drogas. A eficácia foi de 62% (em torná-los abstinentes). Quando associada a antidepressivos e remédios tradicionais, chegou a 72%”, explicou Bruno Rasmussen, diretor médico da Beneva. “Tenho pacientes que tentaram dezenas de internações e, após aplicarem a ibogaína, dizem: ‘Não consigo entender por que eu já tive vontade de usar drogas um dia”, lembra Rasmussen.
Como lembrou a reportagem, a experiência da ibogaína é intensa — e raramente agradável. O efeito dura entre seis e oito horas, podendo causar tonturas, tremores, enjoo e visões de traumas do passado. Por isso, é importante que seu uso seja monitorado não somente durante a sessão, mas antes e depois também, com uma equipe multidisciplinar de profissionais da saúde.
“Também indutora da neuroplasticidade, a substância mostra eficácia contra dois vilões da dependência química: a fissura e a síndrome de abstinência. Tem ajudado, ainda, a melhorar a depressão que os dependentes químicos normalmente apresentam”, diz a matéria.
A reportagem ressalta ainda que outros psicodélicos como MDMA e cogumelos com psilocibina também oferecem perspectivas animadoras no tratamento de transtornos mentais. Mas, por enquanto, não possuem autorização para uso clínico. A possibilidade de administrar substâncias como cetamina e ibogaína em ambiente controlado e com segurança é um grande avanço, que abre caminhos para uma nova forma de entender a saúde mental.