O tempo de duração do álbum mais recente do músico Jon Hopkins é o mesmo de uma experiência com cetamina, cerca de uma hora. Aclamado por trabalhos com artistas como Coldplay e Brian Eno, Hopkins se inspirou no anestésico que vem sendo usado no tratamento da depressão para criar o álbum que leva o nome de “Music For Psychedelic Therapy” (ou “música para terapia psicodélica”).
“Estamos entrando em uma era na qual esse tipo de terapia [com psicodélicos] será legal e difundida, e você precisa ter músicas para isso”, afirmou Hopkins, ao jornal The Guardian. “Tenho que ter muito cuidado para não soar muito grandioso, mas realmente sinto que há uma fronteira aqui – um novo gênero de música.”
Apesar de parecer novidade, a música sempre desempenhou um papel essencial nas experiências com substâncias psicoativas. Para os líderes indígenas que conduzem rituais com plantas que expandem a consciência, ela é um canal para os domínios do subconsciente. A xamã mexicana Maria Sabina, por exemplo, era conhecida por ser versos líricos; os rituais com ibogaína da religião Bwiti, na África central, empregam ritmos rápidos de até 170 batidas por minuto; já etnias da Amazônia que usam ayahuasca, como os Shipibo Conibo, entoam cânticos conhecidos como ícaros.
Não à toa, quando os pesquisadores ocidentais começaram a estudar substâncias psicodélicas, nas décadas de 1950 e 1960, a música foi logo reconhecida pelo seu impacto durante a jornada. Pesquisas recentes só comprovam isso.
Um estudo publicado, em 2018, no periódico Psychopharmacology, conduzido pelo neurocientista Mendel Kaelen e sua equipe do Imperial College, mostrou que a música desempenha uma função terapêutica central na terapia psicodélica. As análises das dezenove entrevistas feitas com pessoas que participaram de sessões com psicodélicos revelaram que a música teve tanto influências “bem-vindas” quanto “indesejadas” nas experiências subjetivas.
“As influências bem-vindas incluíram a evocação de emoções e imagens mentais pessoalmente significativas e terapeuticamente úteis, uma sensação de orientação, abertura e a promoção de calma e segurança”, escreveram os pesquisadores no estudo. “Por outro lado, as influências indesejadas incluíram a evocação de emoções e imagens desagradáveis, uma sensação de desorientação e resistência. Análises de correlação mostraram que a experiência musical dos pacientes estava associada à ocorrência de ‘experiências místicas’ e à produção de insights. Crucialmente, a natureza da experiência musical foi significativamente preditiva das reduções na depressão uma semana após o uso de psilocibina, enquanto a intensidade geral da substância não foi.”
Kaelen também é o criador de um aplicativo de música psicodélica chamado Wavepaths. “A música é uma ferramenta ideal para a terapia porque fornece uma estrutura solta na qual o paciente pode projetar o conteúdo pessoal de suas mentes subjetivas”, afirmou o pesquisador do The Guardian.
De acordo com Kaelen, a música e os psicodélicos evocam respostas parecidas no cérebro, ou seja, trazem o plano emocional para o primeiro plano da consciência, sobrepondo-se ao racional. “Uma das coisas mais importantes que a música faz é fornecer um clima no qual o indivíduo se sinta profundamente reconhecido – de sua experiência de estar bem como é”, acrescenta Kaelen.
Importantes institutos de pesquisa como a Multidisciplinary Association for Psychedelic Studies (Maps) e a Universidade Johns Hopkins disponibilizam de forma online as playlists que usam em seus estudos (você pode ouvir aqui e aqui, respectivamente). No geral, playlists do tipo tendem a misturar escolhas pessoais dos pesquisadores com um protocolo desenvolvido em 1972 pela musicoterapeuta Helen Bonny e o psiquiatra Walter Pahnke, ex-aluno de Timothy Leary. Segundo o protocolo, o arco emocional das músicas deve corresponder aos estágios de uma experiência psicodélica: início, ascensão, pico e retorno à consciência normal.
Como resume o psicólogo Bill Richards, da Johns Hopkins, a música é como a rede de um trapezista. “Se tudo está indo bem, você nem percebe que a rede está lá — você nem ouve a música — mas se você começar a ficar ansioso, ou se precisar, ela está lá para fornecer imediatamente uma estrutura.”
Imagem: Jorge Fakhouri Filho/ Pexels