O apresentador John Oliver dedicou um episódio do seu programa Last Week Tonight, da HBO, ao tema da psicoterapia assistida por psicodélicos (PAP). Com uma mistura de jornalismo e entretenimento, que já rendeu 26 prêmios Emmy ao programa norte-americano, o apresentador mergulhou fundo não apenas nos fatos mais recentes envolvendo a pesquisa psicodélica no tratamento de transtornos mentais, mas também no contexto histórico da proibição e nas polêmicas.
Oliver reforçou que o uso de psicodélicos já é feito há milênios por culturas indígenas e que a busca indiscriminada por essas substâncias já rendeu, na década de 1950, a condenação da xamã Maria Sabina pela sua própria comunidade, depois que ela ganhou destaque na imprensa, transformando o cotidiano da cidade em que vivia no México.
Como lembra o apresentador, na década 1960, já existiam pesquisas que reforçavam o valor terapêutico dos psicodélicos, a exemplo de uma reportagem da CBS News que acompanhava o tratamento para uso abusivo de álcool feito com LSD por um homem de 33 anos, o qual permaneceu sóbrio 25 anos depois do tratamento.
Em 1971, no entanto, o então presidente Richard Nixon deu início a sua campanha de Guerra às Drogas, fazendo com que os psicodélicos recebessem a mesma classificação de drogas de abuso como a heroína, e impedindo a continuidade das pesquisas sobre o tema. Iniciou-se, assim, uma intensa campanha de demonização destas substâncias.
Um exemplo citado pelo apresentador foi um estudo publicado pela Science, que recebeu grande atenção na imprensa, ao afirmar que o MDMA podia causar danos irreparáveis no cérebro de macacos. O estrago já estava feito quando, tempos depois, em uma revisão, descobriram que a substância dada aos primatas no estudo foi metanfetamina.
De volta para o futuro
Com o passar dos anos, no entanto, na década de 2000, o interesse por essas substâncias foi sendo resgatado, fazendo com que retornassem aos holofotes da ciência.
Um trabalho publicado em 2022, na Nature Medicine, por exemplo, apontou os resultados mais promissores já vistos sobre o uso de MDMA para o tratamento de transtorno de estresse pós-traumático. No estudo, que envolveu 90 participantes, 67% das pessoas que fizeram terapia assistida por MDMA deixaram de apresentar diagnóstico positivo para o transtorno.
“O interessante não é só que o MDMA cala seus medos, a capacidade do cérebro de realizar outras conexões e de criar caminhos neuronais também é destacada, fazendo com que as sessões alterem profundamente a forma como as pessoas processam as coisas”, apontou Oliver, reforçando que os psicodélicos não substituem a psicoterapia convencional, mas faz as pessoas ficarem mais abertas a ela.
O apresentador também fez ressalvas em relação ao futuro que se apresenta. “A FDA vai aprovar o MDMA para uso clínico e a psilocibina deve seguir o mesmo caminho alguns anos mais tarde, e, quem sabe, até o LSD um dia. Isso significa que estamos finalmente perto de perceber alguns dos maiores potenciais dos psicodélicos, o que é ótimo. Mas é preciso ser cuidadoso para garantir que não cometamos os mesmos erros do passado ou que criemos novos”, disse.
De acordo com ele, uma das maiores preocupações é a definição de como os psicodélicos vão ser administrados. “A PAP não é para todos, a exemplo de quem sofre de esquizofrenia ou psicose, e mesmo quem pode usar deve se atentar a um setting controlado”, reforçou.
Ainda assim, empresas que tentam patentear moléculas de psicodélicos, como a Compass Pathways, de acordo com o apresentador, chamam atenção pela agressividade com a qual se direcionam à questão. “Quem vai regular? É preciso determinar isso para que ninguém se machuque e para que não voltemos direto para os anos 1960”, concluiu.
O episódio completo pode ser visto no YouTube ou na HBO Max.
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