Uma reportagem especial da revista National Geographic abordou aspectos sociais importantes da iboga, uma planta de origem africana cujas raízes contêm um poderoso psicodélico usado no tratamento de dependências químicas: a ibogaína.
Apesar de ser usada de forma ritualística em vários países da África Central, é no Gabão que ela encontra maior representatividade, já que 5% da população do país de 2,3 milhões de habitantes pratica o Bwiti, religião na qual os iniciados comem ou bebem a raíz.
Como explica a reportagem, assinada por Rachel Nuwer, “a iboga induz um estado semelhante a um sonho no qual as pessoas podem encontrar os seus antepassados ou verem-se a si próprias em vidas passadas”.
A ibogaína pode ser encontrada nas plantas da espécie Voacanga africana (usada por empresas como a Beneva) ou Tabernanthe iboga, que corre risco de extinção. Por isso, pensar em um modelo sustentável de uso é essencial para que as comunidades do Gabão não sejam afetadas pelo crescente uso do psicodélico no Ocidente.
No começo de 2023, Lee White, ministro do Ambiente do Gabão autorizou pela primeira vez a exportação legal de iboga (da espécie Voacanga africana), derivada de cultivadores locais. Esse também foi o primeiro psicoativo comercializado sob o Protocolo de Nagoya, um acordo suplementar à Convenção da Diversidade Biológica, que pretende impedir a exploração de bens culturais e naturais, estabelecendo regras de compartilhamento.
Cerca de um quilograma da planta foi enviado a uma empresa no Canadá, a Terragnosis. A ideia é que a iboga seja processada em alcalóides puros para serem entregues a outra empresa, a mexicana Ambio Life Sciences, que funciona como piloto para o novo programa de comercialização legal. A ideia é que esse seja apenas o início de uma indústria de comércio justo de iboga, respeitando os princípios de equidade, reciprocidade e sustentabilidade.
“Os dependentes que estão se curando no Ocidente estarão, simultaneamente, ajudando as comunidades do Gabão”, explicou na reportagem Yann Guignon, da Blessings of the Forest, uma ONG que lidera o esforço do comércio justo desta substância.
É a organização que ajuda as populações rurais do Gabão a serem recompensadas por suas colheitas, incentivando-os a formarem associações e fornecendo o apoio financeiro e técnico necessário para criar o cultivo. A Blessings também liga essas associações aos compradores internacionais. Como lembra a reportagem, “em troca, as comunidades comprometem-se a não cortar árvores de grande porte para criar espaço para a iboga, não explorar ilegalmente madeira ou animais selvagens e reinvestir pelo menos metade dos seus rendimentos das vendas de iboga em projectos comunitários, como escolas e infra-estruturas”.
Até agora, 13 associações, representando mil pessoas, já se beneficiaram da parceria, plantando mais de 24.000 árvores de iboga em 14 plantações diferentes.
A reportagem destaca, no entanto, alguns pontos de atenção. “A ideia da Blessings of the Forest é muito nobre”, diz Tobias Erny, da Global Iboga Therapy Alliance, mas, segundo ele, as novas regras podem também ser usadas “para ajudar uma certa elite muito próxima da classe dirigente do Gabão a criar uma espécie de monopólio da iboga”.
Segundo Denis Massande, presidente da Associação para o Desenvolvimento da Cultura dos Povos Pigmeus do Gabão, para o comércio de iboga ser verdadeiramente equitativo ele tem de estar “ligado ao povo indígena. É uma forma de obtermos algo em troca daquilo que damos ao mundo”.
Para ler a reportagem original completa, em inglês, clique aqui. Se preferir ler uma versão em português de Portugal, clique aqui.
Imagem: reprodução