O jornal inglês The Guardian se debruçou sobre os tratamentos para dependência feitos com ibogaína. A reportagem assinada pela jornalista Kaitlin Sullivan traz relatos de pacientes que se trataram com a raíz, e mostra preocupação da população do Gabão, na África, com a popularização da substância.
Em alguns países, o tratamento para dependência é uma questão de saúde pública. Nos Estados Unidos, por exemplo, desde o início dos anos 2000, a população sofre com a crise dos opioides. Em 2021, o número de mortes anuais por overdose de drogas alcançou a marca de 100 mil pela primeira vez, sendo que o Centro de Controle de Doença e Prevenção estima que 76 mil delas tenham sido causadas por opioides. .
Lynn Smith começou a usar opioides depois de sofrer um acidente de caminhão. O medicamento ajudava a aliviar as dores, mas também causaram uma dependência que chegou a durar quase 20 anos.
Ela se tratou com a raíz africana em uma clínica no México, onde passou cinco semanas, fazendo psicoterapia e acupuntura, além da experiência propriamente com o psicodélico, que durou 22 horas e foi administrada em pílulas, com acompanhamento médico.
“É como se eu tivesse voltado para um dia antes de usar uma droga”, disse Smith ao Guardian.
Mas o que pode trazer benefício para alguns também pode ser um problema para outros.
Como alertou a reportagem, os efeitos psicoativos da iboga, planta da qual se origina a ibogaína, foram aproveitados durante séculos pelos povos Fang, Mitsogo e Punu, da Bacia do Congo, que fazem parte da religião Bwiti. “A caça furtiva em curso está esgotando as reservas naturais de iboga nas florestas do Gabão e tirando o povo gabonês de uma indústria que não existiria sem o conhecimento indígena”, escreveu Sullivan.
Ao contrário de empresas como a Beneva, que utilizam a substância extraída da planta Voacanga africana, muitos lugares adquirem, de forma ilegal, a planta Tabernanthe iboga, que corre risco de extinção, contruibuindo ainda mais para sua escassez.
Empresas como a Delix Therapeutics, cofundada pelo pesquisador David Olson, buscam amenizar esse problema investindo em um estudo que procura criar uma versão sintética da ibogaína. A fase 3 da pesquisa está prevista para ocorrer no segundo semestre de 2023.
Kurt Rasmussen, diretor científico da Delix, acredita que os compostos sintéticos baseados na estrutura da ibogaína vão impulsionar ainda mais o tratamento da dependência em países como os EUA, onde a ibogaína não pode ser legalmente estudada.
Mas nem todos acham justo que empresas estrangeiras lucrem com base no conhecimento de comunidades tradicionais do Gabão sem que elas sejam recompensadas.
“O maior problema seria se alguém inventasse um remédio que ajudasse a curar uma dessas doenças horríveis e ganhasse dinheiro, e o Gabão não ganhasse nada, sendo que não saberíamos desse conhecimento se não fosse o povo gabonês”, aponta Lee White, ministro do Meio Ambiente do Gabão.
“Todos deveriam ter acesso a esse medicamento, mas de forma legal, sustentável e justa. Não há problema com as empresas ganharem dinheiro, mas quando elas potencialmente geram enormes lucros enquanto a iboga é saqueada em domínio público, isso é um grande problema”, disse.
Como lembra Sullivan, as autoridades gabonesas planejam se reunir no início deste ano para discutir a relação do país com a iboga. Cultivadores como Bibang, citado na reportagem, se preparam para fazer parte de uma indústria global legal e sustentável. “É ouro verde. Quero ter certeza de que sei como cultivá-lo ”, disse ele.
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Imagem: Reproduçao.