A infusão de cetamina pode ser tão eficaz quanto a eletroconvulsoterapia (ECT) para pessoas com depressão resistente que não apresentam psicose. Em determinadas condições, ela ainda oferece menos efeitos colaterais. Essa é uma das conclusões do maior estudo comparativo já feito até agora sobre o tema, com publicação na revista científica The New England Journal of Medicine.
Nos últimos anos, a cetamina (um medicamento usado como anestésico desde os anos 1960) vem ganhando destaque no campo da saúde mental. Isso porque as opções de alívio são limitadas para aqueles que sofrem com depressão resistente — um quadro que atinge um terço das 300 milhões de pessoas diagnosticadas com depressão no mundo, segundo a Organização Mundial de Saúde. Tanto a cetamina quanto a ECT se mostram opções capazes de tratar pessoas nessas condições.
Hoje, o tratamento de ECT é considerado indolor e seguro, mas o estigma associado faz com que ele seja subutilizado. Além disso, alguns efeitos colaterais, como perda temporária de memória, dor muscular ou fraqueza, afastam as pessoas do tratamento.
De acordo com Amit Anand, principal autor do estudo e professor de psiquiatria na Harvard Medical School, a pesquisa, que foi patrocinada pela Cleveland Clinic Foundation, mostra que a cetamina é mais fácil de administrar, com menos ajustes durante o tratamento e menos pacientes desistindo.
“Os resultados foram muito surpreendentes para nós”, disse Anand, ao The New York Times, explicando que a hipótese primária era a de que cetamina e ECT fossem, pelo menos, equivalentes, mas o anestésico acabou demonstrando um melhor desempenho.
“Mais importante, o estudo mostra que a ECT, como esperado, está associada a problemas de memória, enquanto a cetamina não está”, completou Anand.
365 pacientes participaram do estudo, aos quais foram dadas infusões de cetamina ou ECT de forma aleatória. Enquanto quase metade recebeu a cetamina duas vezes por semana, o outro grupo fez tratamento com ECT três vezes no mesmo período. Depois de três semanas, 55% dos pacientes do grupo de cetamina e 41% dos pacientes do grupo de ECT registraram uma redução de 50% ou mais nos sintomas depressivos. Após seis meses, ambos os grupos registraram indicadores de qualidade de vida semelhantes.
Uma limitação observada no estudo foi a de que a quantidade de tratamentos feitos com ECT pode ter sido insuficiente, uma vez que o período foi de apenas três semanas. De acordo com o médico Daniel F. Maixner, da Universidade de Michigan (sem ligação com o estudo), os voluntários começaram os testes recebendo correntes elétricas em apenas um lado do cérebro, o que pode exigir de 10 a 12 sessões, ao contrário das nove usadas no estudo.
Como apontou o especialista ao NYT, se os pacientes tivessem feito mais sessões de ECT, uma proporção maior deles poderia ter respondido ao tratamento. Mas isso provavelmente também teria causado mais efeitos colaterais.
Vale lembrar que a cetamina também apresenta efeitos colaterais, como a possibilidade de dependência. Justamente por esse motivo considera-se que é essencial que as doses sejam reguladas e as infusões sejam feitas em ambiente controlado com acompanhamento médico antes, durante e depois das aplicações.
O próximo passo de Anand e seus colegas é recrutar 1500 pacientes para um estudo comparativo maior, em voluntários com ideação suicida, além da depressão. A ideia é observar também como os efeitos diferem por faixas etárias, e, assim, buscar oferecer opções cada vez mais seguras e eficazes para quem não encontra alívio nos medicamentos disponíveis.
Para ler a reportagem original do The New York Times, clique aqui. Você também pode ler uma tradução em português publicada no jornal O Globo (para assinantes). Veja também o estudo completo.
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Imagem: Reprodução